Duas ervilhas

Luis Carvalho Barreira

Grafias de Duas Ervilhas

serie: instantes trágicos

Fotografia / Poesia

arquivo: 2024_07_22_NK4_2157

POEMA


Duas ervilhas

 

Duas ervilhas gandaiam

em lavrado prato branco.

Uma é esguia e movediça

a outra é plácida e desocupada

pronta a ser degustada.

Ao dirimir do garfo

a inconstante ervilha

esguia-se

e não se deixa trespassar.

De investida em investida

o sedutor poeta

embriagado pela fantasia

teima em bandarilhar.

Exausto de tanto assédio

abandona-a ao pranto

desiste de a picotar...

Quanto à remanente ervilha

tinha o fado traçado

foi papada...

Luis Carvalho Barreira, ODE1O, 1991

“odeio círculos concêntricos”, 2024

Luís Carvalho Barreira

“odeio círculos concêntricos”, 2024

serie: palavras nuas

Fotografia

arquivo: 2024_05_22_LCB_05-683


círculos concêntricos

 

ODE1O círculos concêntricos.

 

Semblantes aros desfolhados

Quero acamar meu desejo

(entre parênteses)

Centrado em teu corpo nu

 

Ah, espera aí...

eu disse que detestava as formas concêntricas?

Não, nada disso!

Não devia estar concentrado!

A excentricidade está entre parênteses.

Inês de Castro

Luís Carvalho Barreira

Inês de Castro (Lusíadas), 2024

serie: palavras nuas

Fotografia

arquivo: 2024_06_28_LCB_06-820


Estavas, linda Inês, posta em sossego,

De teus anos colhendo doce fruto,

Naquele engano da alma, ledo e cego,

Que a Fortuna não deixa durar muito,

Nos saüdosos campos do Mondego,

De teus fermosos olhos nunca enxuto,

Aos montes ensinando e às ervinhas

O nome que no peito escrito tinhas.

Luís de Camões, Lusíadas [Canto III, CXX]

Vidago, 1983

Luís Carvalho Barreira

Vidago, 1983

serie: “quando estas árvores se desnudam, descobrem as minhas raízes

Fotografia

Gelatin Silver print

arquivo: 1983_FOLIO_013_4148


Outono

 

A simplicidade das palavras

são folhas caídas

sendas engelhadas

que o tempo tece

neste corpo levante.

Sorriste, neste caminho inexorável

para o ocaso.

Quero dissipar-me nas memórias

do teu regaço que nega tardar

perder-me nos teus seios primaveris

que as folhas de outono não tardarão recordar.

25 de ABRIL

cravo vermelho, 2019

serie: 25 de Abril, 50 anos

Fotografia / Poema

arquivo: 2019_04_24_IMG_0869_25abril_poema


Olhai à vossa volta

embriagai-vos de verdade

cravos teremos sempre

pois vive em nós a Liberdade

couve, 2024

Luís Carvalho Barreira

couve, 2024

Lisboa

Fotografia

arquivo: 2024_02_10_IMG_2605


De dia

sonho com couves-flores.

À noite

a Margarida faz-me pesadelos...

1988 @ anartchist

A luz é poesia...

Luís Carvalho Barreira

Lisboa, 2024

A luz é a poesia da Natureza.

A Arte é o seu idioma.

Fotografia / Poema

arquivo: 2024_02_10_IMG_2608

Arte

1988 @ anartchist

Os artistas criam.

A Arte é feita pelos Homens.

"Partrilhar"

1988 @ anartchist

“Partrilhar”

 

duas estradas divergem

no lúrido bosque

em adágios

sem nunca discordar

 

duas estradas perdidas

vagabundeiam

no telúrico enseio

sem nunca se encontrar

 

duas estradas vagueiam

sem tino

no meu corpo vazio

sem nunca pausar

 

duas estradas demoram

num corpo que era outro

sem rumo

sem nunca as escutar

 

duas estradas... duas estradas

existem no lamento

do meu coração

sem nunca as poder partrilhar

"dias de chuva"

Luís Carvalho Barreira

“dias de chuva”, 2024

fotografia realizada para ilustrar o poema


Dias de chuva

 

Chovia…

Abrigo na memória

uma janela entreaberta,

o latido das gotas caídas,

seduzidas por letras

cantaroladas nas pontas dos dedos.

 

Nesses dias pardos

que ainda trago na boca...

 

Chovia...

Abri uma gaveta

de infância -

e não havia nada,

nada que me fizesse lembrar

a faceta de transgressor.

 

Chovia...

Desejos esses,

habitados em ímpetos silêncios,

de vaga mundos -

sem sair do regaço da minha mãe.

 

Chovia...

Vertiam-se aqueles beijos

em dia de branco chumbo,

dados com amor e paixão,

como as gotas escorridas,

ecoando melodias

no meu coração

 

[mãe]

2023 @ LCB

Mãe

Lurdes de Jesus Carvalho [Mãe] 1933 - sobre a ausência Preencho espaços ausentesDeambulo em intervalos vaziosPerscruto sons entre vários silênciosFormas difusas de ti, mãe.Desejos que não posso terRaízes que me prendem à terra Que teimam s…

Lurdes de Jesus Carvalho [Mãe] 29.12.1933 - 27.07.2022

Preencho espaços ausentes,
deambulo por intervalos vazios,
perscruto sons
entre vários silêncios –
formas difusas de ti, mãe.

Desejos que não posso ter,
raízes que me prendem à terra,
mas que teimam
em separar-se de mim.

É todo um vazio…
um vazio a pedir preenchimento –
que só tu,
[mãe],
me soubeste dar.

corda

Luís Carvalho Barreira

acorda

discorda

recorda

a corda

concorda

com corda

diz corda

corda…

anartchist, 1986

Cálice

Luís Carvalho Barreira

Book in progress

Cálice, 2000

deixa-me beber o teu néctar

até ao último trago

e esqueçamos as torrentes

desse cálice